quarta-feira, 13 de novembro de 2013

Não confio na minha geração nem para se governar a si própria. E temo pela que se segue. Filhos do 25 de Abril


A geração que fez o 25 de Abril era filha do outro regime. Era filha da
ditadura, da falta de liberdade, da pobre e permanente austeridade e da 4.ª
classe antiga.
Tinha crescido na contenção, na disciplina, na poupança e a saber (os que à
escola tinham acesso) Português e Matemática.
A minha geração era adolescente no 25 de Abril, o que sendo bom para a
adolescência foi mau para a geração.
Enquanto os mais velhos conheceram dois mundos – os que hoje são avós e
saem à rua para comemorar ou ficam em casa a maldizer o dia em que lhes
aconteceu uma revolução – nós nascemos logo num mundo de farra e de festa,
num mundo de sexo, drogas e rock & roll, num mundo de aulas sem faltas e
de hooliganismo juvenil em tudo semelhante ao das claques futebolísticas mas
sob cores ideológicas e partidárias. O hedonismo foi-nos decretado como
filosofia ainda não tínhamos nem barba nem mamas.
A grande descoberta da minha geração foi a opinião: a opinião como princípio
e fim de tudo. Não a informação, o saber, os factos, os números. Não o fazer,
o construir, o trabalhar, o ajudar. A opinião foi o deus da minha geração. Veio
com a liberdade, e ainda bem, mas foi entregue por decreto a adolescentes e
logo misturada com laxismo, falta de disciplina, irresponsabilidade e
passagens administrativas.
Eu acho que minha geração é a geração do “eu acho”. É a que tem controlado
o poder desde Durão Barroso. É a geração deste primeiro-ministro, deste
ministro das Finanças e do anterior primeiro-ministro. E dos principais
directores dos media. E do Bloco de Esquerda e do CDS. E dos empresários do
parecer – que não do fazer.
É uma geração que apenas teve sonhos de desfrute ao contrário da outra que
sonhou com a liberdade, o desenvolvimento e a cidadania. É uma geração sem
biblioteca, nem sala de aula mas com muita RGA e café. É uma geração de
amigos e conhecidos e compinchas e companheiros de copos e de praia. É a
geração da adolescência sem fim. Eu sei do que falo porque faço parte desta
geração.
Uma geração feita para as artes, para a escrita, para a conversa, para a
música e para a viagem. É uma geração de diletantes, de amadores e
amantes. Foi feita para ser nova para sempre e por isso esgotou-se quando a
juventude acabou. Deu bons músicos, bons actores, bons desportistas, bons
artistas. E drogaditos. Mas não deu nenhum bom político, nem nenhum grande
empresário. Talvez porque o hedonismo e a diletância, coisas boas para a
escrita e para as artes, não sejam os melhores valores para actividades que
necessitam disciplina, trabalho, cultura e honestidade; valores, de algum
modo, pouco pertinentes durante aqueles anos de festa.
Eu não confio na minha geração nem para se governar a ela própria quanto
mais para governar o país. O pior é que temo pela que se segue. Uma geração
que tem mais gente formada, mais gente educada mas que tem como
exemplos paternos Durão Barroso, Santana Lopes, José Sócrates, Passos
Coelho, António J. Seguro, João Semedo e companhia. A geração que aí vem
teve-nos como professores. Vai ser preciso um milagre. Ou então teremos que
ressuscitar os velhos. Um milagre, lá está.

Pedro Bidarra
Publicitário, psicossociólogo e autor
Escreve à sexta-feira
Escreve de acordo com a antiga ortografia

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