Nos sapatos punham-se meias solas e “protectores”, para não gastar tacões e biqueiras. Os fatos e sobretudos viravam-se. Colarinhos e punhos das camisas eram mudados. Os buracos das calças remendavam-se, aproveitando o pano de outros sítios (chamava-se pôr fundilhos) e os das peúgas eram cosidos por mãos de fada, até ficarem rendas. As malhas das meias «de vidro» eram apanhadas por «apanhadeiras» instaladas em vãos de portas. E até as gravatas eram viradas.
Mudando a geografia: tachos, panelas e jarros levavam «pingos» de solda quando furados e os fundos, quando gastos, eram substituídos. O mesmo sucedia com recipientes de metal, incluindo penicos. No caso da louça, pratos, travessas e tampas partidos, eram reconstruídos usando «gatos» de arame. Para quem os possuía, quando os pneus dos automóveis ficavam carecas, mandavam-se recauchutar.
De comidas aproveitava-se tudo. Do jantar para a ceia. De um dia para o outro. Deitar fora (sobretudo pão) era considerado pecado, e deixar no prato absolutamente proibido. Faziam-se prodígios com espinhas e peles de peixe (especialmente bacalhau), ossos e cartilagens dos animais.
A geração para quem Vigo era o estrangeiro e a praia no Molhe, as férias possíveis, que, nos tempos da II Guerra e do pós-Guerra limpou o cu a papel de jornal, habituada ao sacrifício, poupança e a usar a imaginação para sobreviver, conhece os contornos da situação para que o país está a ser empurrado. E, acima de tudo, não pode deixar de sentir desprezo pelos que, prometendo o paraíso, se serviram dele para agora defenderem o inferno como única solução para erros e crimes cometidos em nome da Democracia.
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