terça-feira, 3 de setembro de 2019
Triste com a destruição da Amazônia, o escritor Milton Hatoum escreve poema sobre a floresta
1 de setembro de 2019 Mônica Nunes
“Não consigo olhar fotos que mostram incêndios na Amazônia”, desabafou o escritor Milton Hatoum para o jornalista Ubiratan Brasil, de O Estado de São Paulo, jornal do qual é colunista. Desde 1999, ele mora na capital paulista, mas seus livros revelam o quanto “suas raízes continuam fincadas” de forma profunda em Manaus, onde nasceu.
Como Hatoum contou na conversa, seus romances falam de uma cidade que não existe mais e também relatam os problemas da devastação. “O urbanismo em harmonia com a floresta acabou nos anos 1980. A cidade que está lá hoje é uma das mais desiguais do Brasil”.
Desde os anos 1970, aponta para os problemas da devastação. Em 1977, seus versos (livro Amazonas)também denunciavam a destruição das crenças, dos rituais e das aspirações da população amazonense.
Agora, para lamentar os incêndios que destroem a floresta, Hatoum escreveu o poema O Fim que Se Aproxima, publicado por O Estado em primeira mão e que reproduzimos abaixo. Em seguida, vídeo em que ele declama seus versos, editado por Everton Oliveira com fotos de Gabriela Biló.
Atento à realidade brasileira, esta não é primeira vez que Hatoum se engajado com seu talento. Em novembro de 2015, ele participou de uma mobilização pelo clima escrevendo e declamando poesia inspirada nas agruras das mudanças climáticas, mas principalmente na tragédia do Rio Doce, devastado pela lama tóxica da mineradora Samarco.
O fim que se aproxima
Amazonas: mito grego
menos antigo que os mitos da Amazônia.
Os que vivem no Cosmo há milênios
são perseguidos por mãos de ganância,
olhos ávidos: minério, fogo, serragem, fim.
Quem são vocês,
incendiários desde sempre,
ferozes construtores de ruínas?
Os que queimam, impunes, a morada ancestral,
projetam no céu mapas sombrios:
manchas da floresta calcinada,
cicatrizes de rios que não renascem.
atrás da humanidade amazônica?
Que triste pátria delida,
mais armada que amada:
traidora de riquezas e verdades.
Quando tudo for deserto,
o mundo ouvirá rugidos de fantasmas.
E todos vão escutar, numa agonia seca, o eco.
Não existirão mundos, novos ou velhos,
nem passado ou futuro.
No solo de cinzas:
o tempo-espaço vazio.
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