segunda-feira, 6 de setembro de 2021

 




Covid! Mais dados do Reino Unido e a questão das variantes

por Max



O relatório do Public Health England (a agência do Ministério de Saúde britânico), que já vimos na edição nº 20, está a revelar-se uma caixinha de surpresas. O nº 21, publicado no passado dia 20 de Agosto, analisa os dados recolhidos entre 01 de Fevereiro e 15 de Agosto de 2021. E as surpresas não faltam.

No País, 89% das pessoas infectadas com Covid encontravam-se já vacinadas contra o vírus. O restante 11%, obviamente, eram pessoas não vacinadas.

Mais em pormenor: das pessoas com mais de 50 anos afectadas pela variante Delta, que é dominante no Reino Unido, 48.264 resultaram já vacinadas mas infectadas, enquanto apenas 4.891 não eram aquelas não vacinadas. Proporcionalmente, aqueles que acabam numa emergência são só um décimo dos infectados, mas as estatísticas falam mais uma vez a favor dos não vacinados: a proporção é de cerca de quatro vacinados internados contra apenas um não vacinado.

A contagem dos que morreram na mesma faixa etária idade é sempre a favor dos não vacinados: se 1.076 foram os falecidos vacinados, 318 eram não vacinados.

Um resultado surpreendente? Nem tanto. Aliás, é a confirmação de quanto acontece em israel onde, em média, das 500 pessoas admitidas num hospital cerca de 60% eram vacinadas. Mas no caso de israel invocam-se várias justificações alegando que: naquele País a maioria das pessoas está vacinadas (então a vacina serve para quê? Fica a dúvida...); que a maioria é idosa (aqui na Europa somos todos jovens...) e, portanto, mais em risco; que a vacina não imuniza 100% (e disso não há dúvida) e afecta aqueles que são fragilizados e mais velhos (exactamente o que faz a Covid). Vice-versa, a situação no Reino Unido é diferente e até mais interessante.

A prática no Reino Unido consiste em considerar aqueles que tiveram uma única dose da vacina (Pfizer ou Astrazeneca) como vacinados, tendo como discriminante o número de anticorpos produzidos para uma protecção suficiente. O que faz sentido: se conhecemos o limiar inferior dos anticorpos necessários para combater a infecção, quando uma pessoa estiver acima dele estará protegida, mesmo com uma única dose.

Todavia, mesmo ao considerar tal prática, os números continuam a favor dos não vacinados. Na pág. 23 do documento é visível o total dos óbitos, discriminado segundo o número de doses recebidas:
679 eram pacientes vacinados com duas doses
104 eram vacinados com uma dose
390 não eram vacinadas
Vacinas e variantes

Entretanto, há várias vozes que afirmam como são as vacinas a provocar o surgimento de novas variantes. Um estudo publicado no passado mês de Abril pela revista científica Cell é um exemplo disso.

Já o título não deixa margem para dúvidas: Multiple SARS-CoV-2 variants escape neutralization by vaccine-induced humoral immunity ("Múltiplas variantes de SARS-Cov-2 escapam à neutralização por imunidade humoral induzida pela vacina"). O artigo afirma, entre outras coisas, que "a vigilância contínua revelou o aparecimento de variantes que abrigam mutações na spike, o principal alvo da neutralização dos anticorpos". Para compreender o impacto destas variantes, foi avaliada a capacidade neutralizante dos indivíduos que receberam uma ou duas doses de vacinas mRNA273 (Moderna) contra até 10 estirpes de SARS-CoV-2 em circulação global. Metade eram altamente resistentes à neutralização. Isto significa que um número relativamente pequeno de mutações pode mediar uma poderosa fuga das respostas vacinais.

Embora o impacto clínico da resistência à neutralização permaneça ainda incerto, estes resultados realçam o potencial das variantes para escapar à neutralização por imunidade humoral. Isto levanta a hipótese de que pode ser a vacina que induz uma selecção de mutantes mais infecciosos e mais perigosos. Para entende-lo, temos de considerar que os vírus de RNA de cadeia única como estes não só formam mutantes rapidamente, especialmente na parte imunogénica da proteina spike, como também são capazes de fugir com velocidade aos ataques do sistema imunitário. O elevado número de erros na replicação do vírus cria mutações que estão presentes em todos os vírus do novo mutante.

Quando for aplicada a vacina, são produzidos anticorpos específicos ao antigénio da vacina, mas estes anticorpos produzidos não são capazes de se ligar a todos os mutantes menores, pelo que os mutantes menores que escapam à ligação ao anticorpo da vacina são precisamente aqueles que se replicam e causam resistência porque têm uma vantagem selectiva. Por conseguinte, são seleccionados precisamente por via da vacinação.

Quanto mais vacinarmos a população, mais rapidamente criamos resistência vacinal. Além disso, estas são variantes "artificiais", bastante diferentes das que se desenvolvem naturalmente. As variantes naturais são menos agressivas e perigosas, infectam mas não provocam adoecimento, por outras palavras, permitem a endemização, ou seja, o fim da fase aguda da epidemia. O vírus, que é um parasita, sofre uma mutação adequada, adaptando-se ao hospedeiro (o seu habitat natural) com o qual coabita, sem o danificar em demasia e acabando por "aprender" a viver no interior do nosso organismo sem provocar problemas. Não é este o caso das variantes virais seleccionadas através da resistência à vacina: estas mutações não são uma natural evolução do vírus neste sentido mas são uma simples "fuga" daquelas variantes que conseguem resistir à vacina.

Estes resultados sugerem que as vacinas de mRNA podem precisar de ser actualizadas periodicamente para evitar uma potencial perda de eficácia clínica. Daí a ventilada necessidade de uma terceira dose, que é um prelúdio para doses intermináveis, todos os anos. Na prática, as variantes criadas pelas vacinas surgem em força após alguns meses, obrigando os pacientes a assumir doses "atualizadas". E infectando também os não vacinados, que nesta altura já deveriam enfrentar um vírus enfraquecido e que, pelo contrário, têm que lidar com as mutações.

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