domingo, 20 de maio de 2018



Nunca me respondeste, quando te chamei,
E só Deus sabe como era urgente e aflita
A minha voz!
Mas, desgraçadamente sós,
Morrem os que se afogam
No mar da sua própria condição.
O meu, sem margens, é um descampado
Desabrigado.
Vagas e vagas de solidão,
E a tua imagem, litoral sonhado,
Sempre evocada em vão.
Nunca me respondeste, e foi melhor assim.
Um náufrago perpétuo é um pesadelo.
Dizer-me o quê?
Que, de longe, me vias afogar,
Mas que nada podias.
Pois sabias
Que os poetas jurados,
Humanas heresias,
Nascem condenados
A morrer afogados
Todos os dias
No tormentoso mar dos seus pecados.


Miguel Torga


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