quarta-feira, 23 de março de 2011

Emílio Salgari



Quando pronunciamos o nome de Emílio Salgari , vem-nos à mente imagens exóticas de países longínquos de nomes impossíveis , de sultões poderosos e malvados , de belezas em perigo , de corsários destemidos e imparáveis , de piratas de olhos rasgados , de barcos que sulcam os mares da Malásia . . .

Todos imaginam a vida do capitão Emílio Salgari como um verdadeiro romance de aventuras , cheias de episódios trepidantes e de viagens intermináveis . Nada mais longe da realidade com este escritor nascido em Verona , em 1862 , pois o mais perto que teve de uma experiência vivificante a bordo de um navio foi um cruzeiro de três meses pelo mar Adriático . Efectivamente , apesar de ter estudado no instituto naval Paolo Sarpi , em Veneza , nunca chegou a obter a patente de capitão , apesar de se apresentar sempre como se a tivesse . No entanto , foi ali que aprendeu muitos dos dos aspectos técnicos do mundo da marinha que depois aplicou nos seus romances populares .
Salgari encontrou a fórmula de tornar realidade este modo de vida sonhado mas nunca alcançado ao começar a reverter as suas fabulações de viajante no papel , dando início a uma prolífera carreira literária tão repleta de grandes vendas como de críticas desabonatórias . Desde o seu primeiro conto , Os Selvagens de Papua , mostrou aquilo que haveria de padronizar a sua obra literária : um feroz anticolonialismo , totalmente inusitado numa época em que o romance de aventuras , sobretudo o de origem britânica , narrava a excelência das campanhas dos exércitos da rainha Vitória pelo mundo fora . Salgari contrapunha-lhes os seus grandes heróis , Sandokan e o Corsário Negro , sempre disponíveis a lutar contra a ordem estabelecida e a levar a liberdade às Antilhas , a Iucatão ou à Malásia ; e um amor pelos ambientes exóticos , fossem no Médio Oriente ou no Oeste Americano , a par de um gosto pelos títulos altissonantes como O Tigre de Mompracem ou a Pérola de Labuan .

O sucesso como romancista levou Salgari e a sua imaginação a forjar uma biografia falsa , em que mais parece uma personagem das suas obras que uma personagem real . O êxito do romance O Tigre da Malásia , publicado em episódios , em 1883 , e as suas sequelas hesitantes , viu-se ensombrado pela morte dos pais : a mãe faleceu em 1887 , quando Salgari se encontrava a publicar Os Mistérios da Selva Negra e , dois anos depois , o pai suicidou-se . Estes golpes terríveis na sua vida pessoal fariam cair Salgari numa espiral de autodestruição , alcoolismo e doenças venéreas , da qual não conseguiu salvá-lo a sua mulher , a jovem Ida Peruzzi , com quem casou em 1892 , e que o escritor veronês baptizou carinhosamente como "Aída" . Ida deu-lhe quatro filhos , que tiveram nomes tirados dos seus romances : Fátima , Nadir , Romero e Omar .

Ida começou a sofrer de esquizofrenia , o que acabou por confiná-la a um manicómio , onde morreria . Farto de uma vida de sucessos que só enriqueciam os seus editores , enquanto ele próprio sofria de penúria , Emílio Salgari decidiu acabar com a vida . Depois da morte da mulher , e fiel à sua vida imaginativa , a esse romantismo tardio que o fez fantasiar uma existência em terras do Oriente , fez haraquiri , a forma tradicional japonesa de suicídio com honra , rasgando o ventre e a garganta com um iatacã , a 25 de Abril de 1911 . Encontraram três cartas em sua posse : uma destinada aos filhos , pedindo-lhes perdão e deixando-lhes uma herança de 150 libras ; outra dirigida aos jornais , explicando os motivos da sua morte ; e a terceira , para os seus editores , pedindo-lhes que pagassem o funeral com o dinheiro que lhes dera a ganhar .

Sem comentários: